quarta-feira, abril 26, 2006

Sinais positivos, embora ténues

Há alguns sinais positivos, ainda que ténues, da sociedade civil destas ilhas, mormente em S. Miguel, no sentido do rompimento com a letargia e a passividade em que se encontra há anos. Anestesiada que está por um poder político omnipotente e omnipresente na vida dos Açorianos.
A entrevista a um órgão de comunicação social do Padre Weber Machado, antes de abandonar a presidência da Caritas, é de uma enorme coragem e determinação que não é comum nesta terra.
A constituição da organização cívica Caloura Viva para a defesa do património natural e edificado desta bela zona, considerada Sítio de Importância Comunitária, é uma interessante iniciativa.
A polémica conferência de imprensa de Manuel António Martins, ex-homem forte da lavoura micaelense e ex-deputado, com acusações gravíssimas ao presidente do governo regional, revela afronto e determinação.
O planeado protesto dos utilizadores da estrada da Lagoa do Congro devido ao seu péssimo estado, repleta de buracos, que a Secretaria Regional da habitação e Equipamentos se apressou a reparar sorrateira e rapidamente, é uma salutar reacção da sociedade civil.
A criação do Fórum Açores Século XXI, uma organização cívica de individualidades de todos os quadrantes políticos, para discutir e pensar os Açores no futuro, é também uma meritória iniciativa.
As contundentes declarações do médico Manuel Rebimbas, director do serviço de urologia do Divino Espírito Santo, sobre a instalação do equipamento de litoterícia na Terceira, quando os doentes estão essencialmente em S. Miguel, revelam uma atitude destemida e apreciável.
As arrojadas declarações de Manuel Ferreira, um vulto das letras dos Açores, alertando os micaelenses para a passividade em que se encontram e apelando para que acordem, é mais uma desejável reacção cívica.
São sinais evidentes de que a sociedade civil está farta de ser esmagada pelo poder político. Podem ser sinais promissores para o futuro dos Açores.
Contudo ainda se assiste a um silêncio comprometedor das principais forças vivas desta ilha e dos Açores em geral.
A associação dos empresários há muito que é uma dependência do governo regional. Não tem voz nem alma. Enquanto que o governo e autarquias avançam com iniciativas mercantis abusivas e próprias do sector privado.
A associação dos agricultores também há muito que está na dependência financeira do governo. E fala a muito custo e essencialmente para dentro.
A própria Igreja, mormente a sua hierarquia, parece colada ao poder, e há muito que perdeu a sua voz.
Os ambientalistas e ecológicos foram recrutados para a administração e encontram-se mentalmente manietados.
O principal partido da aposição jaze imobilizado, sob uma liderança ausente e frouxa. E caminha rapidamente para um partido marginal da faixa dos 15% dos eleitores. Contribuindo assim para o reforço da democracia de partido quasi-único que se vive nos Açores.
A maioria das IPSS estão condicionadas pela via financeira, permanecendo silenciosas e receosas.
Enquanto isto o estado, serviços da república, governo regional e autarquias, cresce e cresce nesta Região, tornando-se monstruoso, controlando tudo e todos.
Precisamos urgentemente de mais sociedade civil. De mais cidadania. Precisamos de associações de classe activas e autónomas, de associações de pais dinâmicas e organizadas, de uma comunicação social mais livre, mais corajosa para denunciar o que não está bem. Precisamos de contribuintes exigentes em relação à maneira como os seus impostos são aplicados nestas ilhas. Precisamos de professores e médicos isentos, com pensamento próprio, e destemidos. Precisamos de pensadores livres e honestos. Precisamos de empresários frontais e sem medo do poder político. Enfim precisamos de mais e mais sociedade civil. Tenhamos esperança. Há no ar sinais positivos ainda que ténues.

Escavações, aterros e betão em Ponta Delgada

A zona ribeirinha de Ponta Delgada, entre a Praça Vasco da Gama e o Clube Naval, vai acolher, nos próximos anos, 3 projectos de investimento de grandes dimensões.
O Portas do Mar num investimento do governo regional de quase 50 milhões. A central rodoviária e os parques subterrâneos da marginal, num investimento municipal de 30 milhões. O Casino Hotel e o centro comercial da Calheta, um investimento privado, de cerca de 30 milhões. São 110 milhões que vão ser investidos na marginal de Ponta Delgada.
A cidade de Ponta Delgada nunca mais vai ser a mesma, para o bem e para o mal.
O Portas do Mar é um projecto multi-funcional, de excessiva dimensão para o local, que agrupa vários equipamentos. Vai ser um polo de atracção de muito trânsito e variados conflitos na já saturada marginal. A sua própria construção vai trazer problemas sérios a Ponta Delgada nos próximos 2-3 anos. Adivinha-se um caos, na frente hoteleira de Ponta Delgada.
A central rodoviária na Praça Vasco da Gama e os parques subterrâneos na marginal é um projecto também grandioso cujo custo-benefício suscita inúmeras dúvidas, embora se desconheça ainda o seu detalhe. Trazer e concentrar mais trânsito na marginal, à primeira vista, não parece razoável.
Os parques de estacionamento subterrâneos na marginal, para além de poderem ser uma obra complicada, o seu custo não parece compensar o benefício de mais algumas centenas de lugares de estacionamento. Que em muito pouco vão resolver o grave problema de trânsito que subsiste na zona urbana de Ponta Delgada. Entram por ano em S. Miguel alguns milhares de viaturas e uma grande parte destas acaba por circular em Ponta Delgada.
O Casino Hotel e o centro comercial na Calheta é um importante investimento privado, e que vai ser também um polo de concentração de ainda mais trânsito na zona da marina.
Prevê-se, com a concretização destes projectos, uma concentração exagerada de equipamentos na marginal, que vai bloquear completamente esta via, onde já existem importantes unidades hoteleira.
Tudo isto vai ser feito sem em um estudo claro e realista dos impactos urbanísticos e ambientais na marginal de Ponta Delgada. Que deveria ser sobretudo um local de amenidade e lazer para aproveitamento turístico.
Além disso o Portas do Mar com o seu espaço comercial de lojas e o centro comercial no aterro da Calheta podem representar a machadada final no comércio tradicional do centro histórico.
A nova centralidade da marginal vai de certo concorrer com o centro histórico no que concerne ao comércio e à restauração. Lojas mais apelativas, zona nova e agradável, vão naturalmente desviar os consumidores do centro histórico.
Tudo isto vai ser feito sem se ter tido a preocupação das acessibilidades para estes novos equipamentos. Continuamos a ter como único acesso a Avenida Inf. D. Henrique e o seu prolongamento para leste, já um verdadeiro cabo das tormentas para qualquer automobilista.
Estes projectos deviam ser mais realistas, melhor enquadrados no espaço em causa, e sobretudo articulados uns com os outros. O governo tem de se entender com a autarquia e esta tem de se entender com o governo. Para bem das populações, dos munícipes e dos cidadãos desta ilha. A democracia assim exige e obriga. Não podem estar de costas voltadas enquanto os problemas se vão avolumando. E cada um, á sua medida e isoladamente, tenta resolver, mas sempre parcialmente, e com custos financeiros e sociais muito elevados.