quarta-feira, maio 10, 2006

A sociedade do divertimento (e da irresponsabilidade)

Segundo dados do Relatório Anual de Segurança Interna de 2005, a criminalidade está a subir nos Açores, contrariando as estatísticas de 14 distritos de Portugal continental e da Madeira, onde os números indicam a redução de crimes.
Durante o último ano houve 10.437 crimes nos Açores, significando um aumento de 384 crimes, relativamente a 2004. Ou seja, um crescimento de 3,8%.
O Açores são a quarta pior região de Portugal, com um índice de 43,2 crimes por 1.000 habitantes. Um péssimo indicador que em nada abona o poder político regional, as forças de segurança da república e a sociedade civil destas ilhas.
Na Região Autónoma da Madeira o decréscimo da criminalidade foi de 2,9%. No distrito de Faro a redução foi de 12,4%, enquanto que no distrito de Lisboa esta foi 9,9%. No distrito do Porto a criminalidade baixou 6,6%.
Não vale a pena esconder mais. S. Miguel, a maior ilha dos Açores, vive um problema muito grave de alcoolismo. Devido a uma oferta de bebidas alcoólicas desenfreada, permissiva e quantas vezes apoiada pelo poder público, nas muitas festas locais e regionais. Por uma ausência de política de prevenção que possa surtir alguma redução no consumo. E pela promoção de uma sociedade de diversão e do prazer, quantas vezes irresponsável.
S. Miguel também vive já um problema de toxicodependência que começa a ser deveras preocupante, especialmente junto dos jovens em idade escolar.
Estes flagelos contribuem para a destruição e o sofrimento de muitas famílias e está a corroer a sociedade insular.
E para se confirmar basta visitar uma instituição de acolhimento de crianças. Lá está o “produto” desta sociedade de consumo, egoísta e irresponsável.
Para além destes dois flagelos sociais começa-se a viver outro: a insegurança. E o estudo referido vem confirmar o que todos nós, de uma forma ou outra, vamos sentido especialmente nesta ilha do Arcanjo.
Há muitos idosos encurralados nas suas casa com pavor dos assaltos que em alguns concelhos são frequentes e por ondas que arrebatam ruas inteiras.
E há muitos estabelecimentos comerciais que estão a ser frequentemente assaltados para desespero dos seus proprietários.
Há vandalismo por tudo o que é sítio nesta ilha verde. E há uma cultura de impunidade e de libertinagem que grassa por todo o lado.
A par desta situação de medo, terror e desespero, nunca se assistiu a tamanha onda festivaleira como nos dias de hoje, com apoio das autarquias e do governo regional.
Enquanto muitos são vítimas da criminalidade crescente aqui nesta ilha, alguns divertem-se à brava nas duas casas de espectáculos de Ponta Delgada, com espectáculos do exterior, a preços subsidiados, portanto pagos por todos nós contribuintes. E muitos preparam-se para os inúmeros concertos e festivais de verão, com artistas de fora, pagos a peso de ouro, e proporcionados pelas autarquias dos Açores. São milhões e milhões esbanjados e sem qualquer retorno económico, quando tanta falta fariam para debelar estes graves flagelos, que nos estão a minar a todos.
Assiste-se ao apogeu da sociedade do divertimento e do prazer em S. Miguel. E também, quantas vezes, da sociedade da irresponsabilidade. Porque é a alienação e a diversão de alguns perante a desgraça de muitos. Perante a desgraça do alcoolismo, da toxicodependência, da exclusão, da pobreza e da criminalidade crescente, responde-se com música, muita música, circo, ballet, teatro, dito de manifestações culturais, pago por todos e visto por alguns. Tamanha incoerência que se assiste nestas ilhas!