A "Betonização" da Marginal de Ponta Delgada
A “Betonização” da Marginal de Ponta Delgada
Os políticos, mormente os governantes, têm uma atracção muito forte, quase fatal, pelo betão, pela obra corpórea.
O cais de cruzeiros e as infra-estruturas adjacentes é uma obra mastodôntica, faraónica, irrealista, e consome elevados recursos financeiros, para além de ser desproporcional ao estádio de desenvolvimento económico da Região, e seguramente não prioritária.
O projecto consta de um cais de 370 metros para paquetes, da reabilitação das piscinas existentes (mais uma vez!), de uma nova marina com 450 lugares, de um parque de estacionamento subterrâneo para 200 viaturas, de um pavilhão de exposições, várias lojas, de uma zona pedonal e de melhoramentos da orla costeira. Um investimento que com os desvios e os normais trabalhos a mais deve atingir 50 milhões de euros. O financiamento deste projecto vai ser metade do orçamento da Região e 25 milhões de euros do Fundo de Coesão.
Depois de alguma reflexão, chegamos à conclusão que se trata de um projecto de custos certos e benefícios incertos e reduzidos. Se o governo fizesse uma análise custo/benefício deste projecto, de forma isenta e competente, a decisão seria naturalmente de não avançar com ele por não ter retorno económico.
Em primeiro lugar, por se tratar de uma obra no mar e de elevada envergadura, e assim ser sujeita a um concurso internacional, estima-se que mais de metade dos fundos financeiros a aplicar neste investimento acabarão por sair da Região, não criando assim riqueza. As empresas regionais, que pagam aqui os seus imposto, vão ficar apenas com sobras desta obra.
Consideramos depois que o valor incrementável deste projecto é diminuto, quando comparado com a situação existente: paquetes no porto comercial, feira no espaço do antigo hangar da marinha, piscina do pesqueiro e marina actual.
E a questão que se coloca é simples: o que ganha adicionalmente a economia micaelense e regional com este avultado investimento? Ou seja, que receitas adicionais vão entrar nesta pequena economia insular com este investimento? Qual é o ponto crítico deste projecto em número de paquetes a escalar o porto de Ponta Delgada? Lamentamos dizer, mas indubitavelmente que o valor incrementável deste investimento é muito baixo, o que leva a dizer que a decisão teve contornos meramente políticos, e não económicos. Quiçá candidata a obra de regime!
O número de paquetes que passarão pelos Açores nunca serão de molde a viabilizar um empreendimento desta grandiosidade.
Há naturalmente projectos de investimento alternativos que com 50 milhões poderiam ter um efeito multiplicador e indutor de actividade económica muito mais significativo do que este. Undibutavelmente que este projecto vai ficar pendurado no orçamento da Região durante muitos anos. É mais um elefante branco em perspectiva, a fazer lembrar o Porto Oceânico da Praia da Vitória.
A Madeira recebe, no seu porto comercial do Funchal, mais de 300 paquetes por ano. Nunca teve necessidade de um cais acostável para o efeito. Nos Açores onde atracam duas ou três dezenas de paquetes por ano, temos um governo que quer investir 50 milhões de euros. Um luxo asiático incompatível com uma Região das mais pobres da Europa e ainda com problemas sociais graves.
O pavilhão de exposições previsto não vai resolver o problema do espaço para os comerciantes realizarem as suas mostras e feiras. Por que pequeno, limitado e sem estacionamento suficiente. Um parque de 200 lugares para nada serve. Agora não se compreende o silêncio da associação empresarial de S. Miguel em relação a este congestionado e limitado pavilhão.
Este projecto mirabolante poder ser um polo de atracção de trânsito que poderá entupir totalmente a marginal e a cidade de Ponta Delgada. Estranha-se também o silêncio da Autarquia em relação a este investimento.
A nova marina é uma infra-estrutura para servir os locais e não vai trazer mais riqueza, não é um investimento reprodutivo. Assim como as novas piscinas que acabam por servir apenas os locais.
O presidente do governo afirmou que esta importante obra “mudará significativamente a face de Ponta Delgada e o seu relacionamento com o mar”. Aqui nesta frase está tudo dito, e não podemos estar mais de acordo.
A face de Ponta Delgada mudará certamente, mas para muito pior. Ficará uma cidade “betonizada”, com uma manha brutal de betão a entrar pela baia do porto. Parte da sua singularidade e especificidade vai-se com este arrepiante projecto. O seu relacionamento com o mar deteriora-se na medida em que deixaremos de ter a vista do mar até ao infinito para passarmos a ver a proa, o convés, e os andares de camarotes de um qualquer barco de cruzeiro. Temos a certeza que a grande maioria dos micaelenses preferiria ver o mar até à linha do horizonte.
O presidente do governo vai mais longe e diz que este projecto é de “carácter poderosamente reprodutivo”. Nada mais falso. Se o governo tivesse feito a tal análise custo/benefício, como as empresas fazem os estudos de viabilidade para os seus projectos de investimento, nunca teria tomado a decisão de avançar para este monstro de betão.
Não se prevêem receitas deste investimento suficientes para um retorno económico num período de três décadas. Não tem efeitos multiplicadores relevantes na economia de S. Miguel.
São importantes e avultados recursos financeiros que poderiam ser aplicados em outros projectos alternativos.
Querem saber alguns? Invistam nos recursos humanos desta Região, na massa cinzenta, com retorno garantido. Melhorem a organização e o funcionamento das escolas na Região. Invistam no ensino básico, no secundário, nas escolas profissionais, nos politécnicos. Invistam na criação de pequenas empresas, na criação dos seus próprios postos de trabalho. Invistam na qualificação dos açorianos que querem trabalhar no turismo para termos serviços de melhor qualidade. Invistam na reforma da administração regional, com uma máquina grandiosa, pesada e pouco eficiente.
Invistam no saneamento de Unidades de Saúde e na melhoria dos cuidados de saúde prestados na Região. Invistam a sério no combate ao alcoolismo e à toxicodependência, verdadeiras chagas sociais nos Açores.
Fomentem e apoiem lares para idosos, de qualidade, para poderem viver os seus últimos dias de forma digna e humanizada.
Invistam na promoção turística da Região no exterior, mas de forma séria, competente e sistematizada. nvistam em habitações para aqueles açorianos que vivem em condições sub-humanas, em bolsas de misérias espalhadas por todas as ilhas.
Mas se calhar um cais de cruzeiros e suas infra-estruturas mirabolantes dá mais nas vistas e serve bem como obra de regime, quiçá para colocar no futuro um busto, uma estátua, uma placa toponímica, dos governantes actuais, para a posteridade. Mas não contribui per si para a sustentação económica desta Região. Isto é certo e seguro. E esta Região não se pode dar ao luxo destas aventuras.
2 Comments:
Na costa espanhola há 1 marina em cada 3 km , mais ou menos. Eles devem ser masoquistas...ou parvos...
Os Açores estão a meio caminho entre os EEUU e a Europa e no trajecto de quem vem de sul e sudoeste, uma marina de 450 lugares já não é má, dá para os locais e para uma centena de visitantes. É melhor do que nada!
E é centenas de vezes melhor que aquela insignificância que há em VFCampo a que chamam pomposamente Marina...e que não tem nem meia dúzia de lugares para barcos de alto mar, digamos com 12 a 15 metros.
Faço votos que a marina de Ponta Delgada e a sua envolvente , tragam a animação cultural e económica, que a minha terra natal merece.
Fátima Cardoso
As Portas do Mar, vão ter certamente no seu inicio de vida, muitissima afluencia como aconteceu com o Parque Atlantico e com recentecemnte a MacDonalds. Mas como é certo e sabido, as pessoas rápidamente se fartam das coisas novas. Se forem a perguntar em questionarios de rua a pessoa bem letradas e conhecedoras do porjecto em promenor, irão ver que 95% destas estão muito satisfeitas(falam, falam, falam, mas não sabem tomar medidas como esta). A novidade atrai desconfianca, sempre foi assime sempre á de ser. As Portas do Mar irão ser magnificas e todos os que concordam com tal obra (98,7%) estão desejosos de esta estar terminada. Portanto, e tal como foi dito, estas obras existem nas grandes e desenvolvidas metrópoles, fazendo assim de Ponta Delgada, uma Cidade com dignidade. Portanto e como alguem comentou, vão mas é para o meio dos pastos, comr erva salgada junto com as Vacas que la estejam. E Sintam o Cheiro a Bosta da "Natureza Viva". Tá bom?...
Adeus
reisenspreichen@gmail.com
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