sexta-feira, outubro 07, 2005

O betão e a criação de riqueza

Agora que está a terminar a campanha eleitoral autárquica, onde houve muito folguedo e propaganda e pouco conteúdo, convém serenamente analisar a situação económica da Região Autónoma dos Açores à luz dos últimos dados do Instituto Nacional de Estatísticas (INE).
Ao contrário do que o governo fez transparecer para a comunicação social os principais indicadores económicos são desfavoráveis aos Açores. Apesar do avultado investimento público realizado nestas ilhas o Produto Interno Bruto (PIB) não cresce adequadamente e não há criação de riqueza.
O PIB dos Açores passou de 2.422 m€ em 2002 para 2.469 m€ em 2003. Uma taxa de crescimento real negativa de -0,8%.
Por seu lado a Madeira, a outra região autónoma, teve um crescimento real positivo de 1,7%, passando o PIB de 3.476 para 3.651 m€.
O PIB per capita dos Açores foi de 10.337€ em 2003. A média nacional foi de 12.500€. Este importante indicador representa nos Açores ainda e apenas 83% da média nacional. O facto é que, apesar do elevado investimento público, permanece um fosso muito grande, medido por este indicador, entre a RAA e a média nacional. Por seu lado o PIB per capita da Madeira foi de 15.113€.
Assim o PIB per capita dos Açores representa apenas 56% da União Europeia (a 15 países) agravando-se mesmo em relação ao verificado em 2002. Portanto estamos a divergir em relação à Europa.
A produtividade nos Açores atingiu 21.211€ em 2003. A média nacional foi de 26.050€. Portanto a produtividade dos Açores é ainda e apenas 81% da média nacional e agravou-se de 2002 (82%) para 2003. Estamos neste indicador muito mal. Produzimos muito pouco nos Açores. A Madeira teve uma produtividade de 30.337€ o que representa um diferencial de 43% em relação aos Açores.
Continuamos a não criar riqueza nestas ilhas. E isto apesar do investimento público, regional e autárquico, muito avultado.
A conclusão é óbvia: grande parte do investimento realizado não é reprodutivo. Não induz mais actividade económica. Aliás durante esta campanha eleitoral assistimos a promessas perfeitamente absurdas e irresponsáveis de uma megalomania arrepiante. Apenas se enche a bota com mais betão sem olhar à dinamização empresarial e à criação de riqueza.
Mais betão não necessariamente traz riqueza. Quando os projectos de investimento não são reprodutivos não provocam dinamização empresarial. E sem dinamização empresarial não há criação de riqueza.
Os políticos caem rapidamente no facilitismo dos projectos megalómanos, desnecessários e não prioritários, por razões exclusivamente políticas e amiúde para alimentar certas e determinadas elites.
O governo e as autarquias têm de proceder à avaliação à priori da rentabilidade de cada projecto de investimento. Devem elaborar o cálculo do seu custo de oportunidade, ou seja, justificação detalhada da prioridade concedida a cada projecto em detrimento de outros. Só assim serão seleccionados os projectos reprodutivos e de rendibilidade assegurada, e só assim se faz uma gestão transparente e rigorosa do erário público. Infelizmente não é isto que se passa. E os grandes projectos de investimento processam-se agora por ondas de moda. Ora são os pavilhões multiusos, ora são as marinas, ora são os cais acostáveis. São projectos de duvidosa rendibilidade e com custos de oportunidade muito elevados.
Neste estádio de desenvolvimento dos Açores precisamos muito mais de investimentos nas pessoas e na organização do que investimentos sumptuosos em betão. Porque estes só por si não criam riqueza. São as pessoas que vão criar riqueza, que vão dinamizar e inovar a actividade económica, na produção de bens e serviços transacionáveis. E este investimento, nas pessoas, tem retorno garantido.