segunda-feira, junho 06, 2005

As Impurezas dos Políticos

O Bispo de Aveiro, D. António Marcelino, é daquelas personalidades que nos habituaram a uma frontalidade e clarividência notáveis, destacando-se nesta pobre, cinzenta e indiferente sociedade portuguesa.
Num artigo, no Correio do Vouga, o prelado considera “pobre, demasiado pobre, a nossa cultura política”.
E com uma lucidez invulgar, aponta o que considera ser as “impurezas” da acção política: “favores que se pagam, facturas que se apresentam a saldar, gente que se vê subir com a ajuda de mãos invisíveis, cadeiras não adaptadas aos que nelas se querem sentar, pôr na luz da ribalta jovens que ainda não tiveram tempo para aprender na escola da vida, e que mal abrem a boca, julgam dizer a última palavra sobre o assunto, zangas de compadres e rivalidades incontidas entre sócios do mesmo clube”.
Mais diz o Bispo de Aveiro que “o povo que vota, trabalha e paga impostos anda, normalmente, muito arredado das discussões políticas e daquilo que as provoca. Porém não está alheio às perturbações e consequências que delas derivam”.
Vai ainda mais longe e diz que “na política não têm lugar os que só pensam em si e no seu partido”. E avisa: “o povo aguenta, mas a paciência tem limites”.
Como diria o meu avô, “boca santa” esta do Bispo de Aveiro. Uma enorme pedrada no charco, onde “vivem” os políticos e desenvolvem a política que temos.
Contudo afirmações desta natureza não aparecem na comunicação social de grande expressão, quiçá totalmente feita com os políticos, e pertencente a poderes económicos coligados com políticos no poder, ou à beira do poder. De facto precisamos urgentemente de novos políticos e de nova política. Políticos humanistas, solidários, sérios, serenos e sensatos, e conscientes do serviço público que prestam. Governantes e autarcas que cada vez que autorizem uma despesa, pensem sempre, que se trata de dinheiro dos contribuintes, e exclusivamente para o bem comum.
Infelizmente, nos Açores, temos uma classe política que enferma das mesmas impurezas, que a sua congénere nacional.
É analisar o rol de cidadãos que são chamados para cargos políticos. Muitos deles sem qualquer formação, pessoal ou mesmo profissional. Limitam-se a gravitar à roda de um secretário, de um presidente de câmara ou de um presidente do governo. Gente míngua de conhecimentos, mas com sede de poder. Gente que se apunhala constantemente, que se acotovela e que se coloca em bicos dos pés para serem notados. Que se especializa na intriga, no clientelismo, na petulância e no seguidismo. Gente que aprende logo a fazer de conta, a ludibriar a opinião pública. Gente que apura o narcisismo, e olha para si essencialmente, e às vezes para o partido que a suporta. Salvo honrosas excepções, são em geral gente impura e ímpia.
Não é por acaso que esta gente não é benquista, e representa nos dias de hoje uma classe pouco apreciada ou até detestada, ironicamente pelo próprio povo que a elege, mas que logo depois aprende a repudiá-la.